Origem: Brasil
Diretor: Matheus Nachtergaele
Roteiro: Matheus Nachtergaele e Hilton Lacerda
Com: Daniel Oliveira, Jackson Antunes, Dira Paes, Cassia
Kiss, Juliano Cazaerré
Um
filme sobre fé, loucura, maldades, humanidades, angústias e incertezas.
A
história de A Festa da Menina Morta se
passa na Amazônia, em um vilarejo ribeirinho, que vive da pesca e,
principalmente, da fé daqueles que acreditam na divindade de Santinho (Daniel
Oliveira). Um jovem de traços afeminados que foi declarado santo ainda menino, ao
achar o vestidinho azul de uma criança desaparecida, única prova do fim de Maria
Cecília.
Desde
então, o menino vive separado do mundo real, trancafiado em sua própria casa,
vestido com a roupa de sua mãe (Cassia Kiss), morta quando ele era ainda bem
pequeno. Com o aval e o estímulo do pai (Jackson Antunes), com quem mantém uma
relação incestuosa, Santinho cresce com o ônus e o bônus de ser especial. Dono
de uma personalidade complicada e misteriosa, ele grita e chora ao mesmo tempo.
Ele se sente, de uma só vez, superior e indefeso. Ele é forte e fraco. Ele dá
benção, mas precisa constantemente de colo.
A
cada ano, o vilarejo comemora, com uma grande festa, a data em que o vestido
foi enviado por Deus às mãos do menino-santo: é a Festa da Menina Morta. Um evento
que movimenta a economia daquela pequena cidade e que tem Santinho como figura
de destaque.
Selecionado
para a mostra Un Certain Regard do
Festival de Cannes 2008, o primeiro filme de Matheus Nachtergaele como diretor
é, sem dúvida, um filme que desconcerta, perturba, que nos instiga a pensar
sobre certas crenças populares que acabam por tornarem-se verdades
inquestionáveis. Não se trata de um filme leve. Ao contrário. Muitas cenas são
bem pesadas, com uma carga dramática intensa, capazes de nos deixarem bastante angustiados. Mas vale a pena, pois há muito o que tirar desta história. Sem
falar que há muito da nossa cultura miscigenada ali dentro. Uma cultura que coloca
no mesmo pote índios, negros, brancos, cristianismo, rituais indígenas, macumba
e muito mais.
Com
uma câmera na mão e um olhar glauberrocheriano
na cabeça, o filme de Nachtergaele nos mostra, assim, um Brasil real, nu e
cru, bem ao estilo Cinema Novo de
ser. Ele explora ainda de maneira inteligente e acertada a profundidade do
campo, permitindo-nos observar várias ações que acontecem ao mesmo tempo no
primeiro, segundo e, às vezes, até em um terceiro plano.
A
fotografia de Lula Carvalho é também excelente, explorando bastante a cor azul,
que se faz presente em quase todas as cenas, possivelmente representando a
divindade de Santinho. Além de ser esta também
a cor do vestido da Menina.
A Festa da Menina Morta é, assim, um filme de um
diretor estreante que já começou sua nova etapa com o pé direito!
Lilia Lustosa